Educação em Valores Morais
Educação em Valores Morais – O intrínseco processo de discernimento de significados e responsabilidades que são aprendidos através da vida, para toda vida.
(16 de setembro de 2021)
RESUMO
O presente trabalho visa propor uma metodologia de educação em valores morais aplicável à escolas de ensino fundamental e médio, complementado com o estudo acerca do conceito e estruturação do desenvolvimento moral de um indivíduo durante a infância, salientando ainda quais as implicações que se apresentam, acima de tudo, em uma dimensão social, quando o mesmo não é individualmente estratificado.
PALAVRAS‒CHAVES
Consciência, individuação, desenvolvimento moral, significado, responsabilidade, autonomia, ego, ambiente social, saúde social, bem coletivo.
INTRODUÇÃO
O último século que nos antecedeu foi marcado por abundantes estudos que buscavam compreender a natureza do comportamento humano, à exemplo de Skinner (Susquehanna, 20 de março de 1904 – Cambridge, 18 de agosto de 1990), Piaget (Neuchâtel, 9 de agosto de 1896 - Genebra, 16 de setembro de 1980) e Foucault (Poitiers, 15 de outubro de 1926 – Paris, 25 de junho de 1984). Pode-se dizer que a ocupação do conhecimento sistematizado em torno de algo tão subjetivo e, a princípio, intangível quanto a mentalidade não havia tido tamanho grau de importância desde o período socrático, com a filosofia se ocupando de pensamentos que se indagavam da origem das ideias e da composição imaterial humana como suposta resposta a capacidade racional de receber e emitir conhecimento, forma, valores e conceitos. Ou seja, a capacidade cognitiva em si e o caráter “auto indagativo” que a singularizava.
No entanto, tais questões começaram a ser levantadas não mais com a mesma avidez filosófica afoita pela primeira descoberta de mundo, após a desilusão e progressivo abandono de suas crenças míticas, mas com uma preocupação com a saúde mental e a necessidade de compreender aquilo que se revelou ser o mais próprio e insubstituível à pessoa humana: a identidade individual, instância experienciável reconhecida como uma entidade única e própria, ou pessoal, a qual chamamos de “eu”.
Muito se teorizou sobre a mente, sua formação, funcionamento e os fatores e variáveis que influenciam ou mesmo determinariam o modo com que pensamos e, até, inconscientemente interpretamos nossas experiências que consequentemente servem como estratificação da elaboração de princípios, mas pouco se ateve a uma outra questão que vai além do campo puramente teórico e aguarda de nós uma aplicação dela como resposta: quais princípios são estes ensinados hoje em nossas escolas com o intuito de capacitar as pessoas à vida? E quais são aqueles outros valores que a escola, de maneira infeliz, tem pecado ao não transmiti-los ou não mais como um dia já os transmitiu? Teria hoje a escolarização ainda alguma utilidade fora a da capacitação profissional? E seria mesmo apenas nesse aspecto que ela deveria justificar a sua existência? Não teria de algum modo a escola e os professores que a constituem uma missão muito mais primordial do que essa a que foi condicionada por forças institucionais?
Acreditamos fielmente que sim, a escola tem um papel maior do que isso e do qual também não pode se esquivar.
Procuramos aqui expor qual é esse papel, por que ele se faz tão necessário e os riscos que se apresentam em escala social quando nós, enquanto educadores, não o assumimos. Para além desta parte expositiva, também propomos ao final como contornar essa situação que se instalou no presente molde educacional através de algumas propostas de intervenção nos espaços escolares, nos baseando sempre em dois fatores: pesquisas de propriedade na área da educação e experiências já executadas em que foi demonstrado o êxito do que adotamos como proposição.
TESE
“É preferível a ignorância absoluta ao conhecimento em mãos inadequadas.”
(Platão)
A Academia de Platão, assim como o Museu de Pitágoras ou o Museu de Aristóteles, não exigia que seus ingressantes tivessem vastos e profundos conhecimentos prévios, mas que tivessem uma base moral sólida. Esse era um costume comum entre as primeiras academias da antiguidade. Para elas, pouco importava o que os indivíduos sabiam enquanto conhecimento ou habilidades técnicas, por compreenderem que importava, antes de tudo, a base moral que os alunos tinham para validarem o que estavam por saber. Equivalentemente a uma espécie de vestibular moral, o que determinava o ingresso de qualquer membro em tais academias era a sua integridade, pois era a partir desse elemento basilar que se erguia todo o edifício de competências que posteriormente lhes seria ensinado. Já o contrário, no entendimento dos mestres gregos, era impossível de se acontecer – crer que com alguma multiplicidade de estudos a respeito da natureza, cálculos, línguas e dos fenômenos naturais se garante alguma projeção de futuro em sociedade que não seja coberto de incertezas e constantemente ameaçada por aqueles mesmos que a integram. Por outro lado, se o que for fomentado precedentemente à qualquer outra coisa que se queira instruir for uma base em valores fundamentais que possibilitem e incentivem, dentre outras coisas, o convívio entre diferentes e a criticidade, o resto se informa rápido e de maneira até muito mais fácil do que se executado de outra forma.
Atualmente, temos cursos abundantes sobre temáticas incontáveis, e praticamente qualquer um pode acessá-los e aprender qualquer coisa, através de plataformas diversas e sem grande esforço. Assim, alcançamos um grau de capacitação técnica muito maior do que qualquer antiguidade sonhava um dia poder alcançar, e a sociedade contemporânea como um todo provou ser muito eficiente do ponto de vista da formação técnica, visto também a valorização que essas formações possuem para o mercado de trabalho. E assim vivemos e prosseguimos os dias, “conforme” o esperado dentro da “normalidade” do repertório escolar. Uso precisamente esses termos não por acaso, mas porque são os que melhor expressam o tipo de moralidade que nosso ensino predominante (aquele usurpado por interesses de todas as naturezas, menos a do desenvolvimento pessoal do estudante) passou então a semear desde cedo na escola: o ensino da normalidade, da conveniência, do se conformar, de abdicar-se de um potencial próprio e singular para adquirir a mesma forma – em conformidade – com o todo.
O tipo de mentalidade que a escola aguarda de seus estudantes é o mesmo tipo que passa a ensinar a eles. E essa mentalidade, ou educação, é a composição dos seus valores morais. Tendo um ensino dessa natureza de moralidade, em prol de uma suposta satisfação geral da sociedade (mas que de modo algum a beneficia!), temos como produto estudantes igualmente satisfeitos a estilo de vida contemporânea, a uma sociedade tal como ela já se encontra, e que não possui nenhuma proposição, nenhum propósito ao seu exercício que não aquele conformado a estudar apenas o suficiente para poder conseguir uma vaga de emprego que lhe remunerar um salário também “suficiente”.
Invertemos as prioridades de formação ao procurarmos primeiro e principalmente capacitar os cidadãos para atender os campos da profissão para depois, quando muito, apenas no segundo grau escolar iniciá-los em alguma disciplina que vise aspirar alguma real criticidade no indivíduo. Nesse estágio, no entanto, a sua mente já foi tão condicionada aos moldes de repetição, submissão e uniformização que buscar algum desenvolvimento moral por parte da filosofia ou da sociologia se torna um desafio astronômico, beirando o impossível. Tanto, que o próprio indivíduo tende a não conseguir enxergar nessas disciplinas sequer um grau de relevância, passando então a tê-las como inúteis para si, cumprindo-se assim o interesse das elites detentoras do status social.
Faz bem lembrar que existe constantemente um imaginário coletivo, herdado do passado mas ainda presente e que volta a nos visitar de tempos em tempos, sempre quando se inicia o desenvolvimento de alguma nova tecnologia e descobertas, onde nele se crê que o avanço dessas tecnologias irão finalmente solucionar os problemas presentes no cenário mundial. Como se a ferramenta tivesse a capacidade de se operar por conta própria e apontar e seguir em direção a um ideal humanitário, quando a própria humanidade sequer é familiarizada com tal caminho. Por melhor que seja a tecnologia, as técnicas e os equipamentos que possamos vir a desenvolver, se não houver pessoas de personalidades éticas capazes de utilizar esses recursos de forma adequada, podemos ter como resultado o exato oposto daquilo que esperamos conseguir com essas mesmas coisas.
Dessa forma, percebemos que a problemática humana presente em escala mundial não reside na falta de conhecimentos técnicos. Os grandes problemas com os quais lidamos hoje não são de natureza técnica, mas sim de natureza humana.
A LÓGICA DA MOTIVAÇÃO HUMANA:
Em uma linha horizontal representa-se a consciência animal, correspondente ao sistema límbico (cérebro mamífero), que é motivada de forma dual: medo ou desejo, dor ou prazer. É a partir dessa dicotomia básica de sentimentos que se adestra basicamente qualquer mamífero que se queira. Como a linguagem rude usada para fazer com que a foca de circo execute seus truques – a agressão é uma correção e a sardinha, sua parabenização. Ou um rato de estudos no laboratório, com um queijo para dizer sim e um choque para dizer não. Ou ainda um cão quando é encontrado em cima de uma mesa, em que para fazer com que desça basta ou oferece algo que ele goste no chão para que atrai-lo, ou então mostrar uma sandália para ameaçá-lo e assim fazer com que abandone a posição.
Essa mesma lógica de movimentação também está presente no ser humano, isso se considerarmos somente o seu caráter biológico. E é também baseado nessa lógica que muitas abordagens pedagógicas tem buscado formar as crianças: ponto extra por bom comportamento ou coordenação; sair mais cedo para o intervalo ou ficar mais tempo como castigo; direito a passeio escolar ou suspensão… São algumas barganhas que a escola se acostumou a utilizar como método de controle sobre os discentes. Com efeito, acostumou o aluno a se movimentar em função da dualidade primitiva de medo e desejo, ao implicitamente estar ensinando, com isso, que ele deve agir apenas de acordo com interesses próprios. Se alguma circunstância do mundo chegar até ele onde não há nela nada relacionado aos seus desejos ou aos seus medos para que possa então agir ativamente sobre ela, isso será o bastante para que acredite que tal circunstância, onde ele poderia e sentiria/saberia dever agir, não lhe diz respeito por não envolver nenhum de seus interesses.
Infelizmente as escolas têm, não confrontado essa dinâmica comportamental, mas reafirmando ela ao proceder com um sistema que até hoje, no caso nacional, vigora com nítidos traços de um molde ditatorial. O que a escola deveria fazer era ensinar valores morais para que assim fosse ensinado, no lugar do medo e do prazer, o dever pelo comprometimento consciente dos valores internalizados.
O SISTEMA DE CRENÇAS E A PERPETUAÇÃO DO FALSO EU:
Por que é tão difícil para as pessoas questionarem os seus sistemas de crenças? Repare que as causas mais profundas, como sempre acontecem, são de natureza afetiva. Muitas vezes, ao longo de uma trajetória em sociedade, nós nos definimos também em função de nossas crenças e nossas convicções, e de certa maneira as ideias estão associadas àquilo que dizemos e julgamos ser o certo. A partir do momento em que aceitamos submeter as nossas crenças a um juízo crítico que possa ameaçá-las, colocá-las em xeque, isso implica também colocar sob suspeição a imagem do “eu” que, junto a todo o sistema de crenças, foi formado até o momento. E tal prática é dolorosa, pois fere a profunda relação afetiva que desenvolvemos com essa identidade que é indelevelmente associada às crenças que embarca, tanto quanto essas são o que nos legitima a ser do jeito que somos, e tal idealização só pode existir enquanto o sistema de crenças permanecer sendo creditado. Em sistemas morais baseados em convicções, normas generalizadas e certezas, se uma falha for reconhecida dentro de uma análise crítica, todo o sistema é ameaçado, e com ele esse falso “eu”. Por isso, o melhor meio de preservar alguma forma de identidade inalterável é, igualmente, adotar um sistema irremediável que preserve o mesmo termo. Logo, qualquer proposta de auto análise e crítica de seus elementos, seus princípios, se faz indesejável por também ameaçá-lo.
É traço de um forte desenvolvimento moral do indivíduo ‑ que prioriza não a preservação de seus próprios interesses e do ego, mas a transparência e compreensão de mundo ‑ a capacidade de revisitar-se criticamente, ao nível de poder rever seus ideais equivocados ou apenas já obsoletos, que não condizem mais consigo mesmo devido as mudanças sofridas com o tempo, e poder dizer àqueles aos quais se relaciona: “lembra quando eu lhe disse aquilo? Pois então: eu estava muito, mas muito equivocado” e atualizar, assim, a imagem de si para os demais.
O que hoje eu considero mais próximo da verdade, amanhã poderei não considerar mais porque não há problema nenhum em constatar e reconhecer a natural limitação de nossas concepções. Isso, porém, só indivíduos com uma base moral forjada e sem medo de se descobrirem em engano têm a capacidade de executar.
JUSTIFICATIVA
Para que se entenda objetivamente o que trazemos como justificativa e de todo o motivo para que se possa tratar do assunto aqui proposto, partimos do pressuposto de que toda doença tem basicamente duas causas: a primeira causa está implícita na questão da propagação no ambiente e a segunda causa diz respeito propriamente ao organismo da pessoa. Fazendo uma aplicação disso em relação ao que foi descrito até agora, a sociedade está para o ambiente tanto quanto os indivíduos que a compõem estão para o organismo de onde se constata a fonte da doença que, tendo como meio de propagação o próprio espaço social, se torna viral na medida em que sua fonte não é tratada, e torna-se, então, o retrato mais fiel daquela sociedade adoecida.
Dessa maneira é nítido perceber o quão inútil é oferecer uma solução para tratar problemas de ordem social ética quando não se considera, primeira e essencialmente, a origem individual de onde surge o problema, da mesma forma que é inviável buscar a cura de uma doença se dedicando a tratar apenas de seus sintomas, que advém dela. Do contrário, propor qualquer medida que visa sanar as enfermidades do presente ambiente social sem que antes se dedique a tratar do caos individual da realidade mais próxima da pessoa, é decerto a receita se não para algo menos que a frustração de quem assim se compromete a fazer, pois há de ver que todas as suas medidas só serão eficientes a um grupo circunstancial até que o cenário social e a própria realidade volte a se reconfigurar e tais medidas caiam em ineficiência já que se basearam em problemas isolados da perspectiva coletiva e não no tocante de onde parte os desígnios de toda a ação unicamente capaz de transformar, em coletivo, todo o cenário social: a consciência pessoal.
Dito isto, observa-se que seria um simplismo, se não uma grande ingenuidade, partirmos para qualquer perspectiva que se comprometa com o saneamento do indivíduo que não desemboque também em uma cura social profunda. Igual simplismo seria considerar apenas a perspectiva social esquecendo que o meio social não possui um psiquismo tangível; ele é apenas o plano último no qual a enfermidade enfim adquiri rosto, trejeitos e toda sua forma visual em delitos, corrupção, miséria e crises de ordens diversas, mas não a é origem em si que está muito por detrás deste plano. Ou seja, deve-se propor uma intervenção nos indivíduos que – estes sim – possuem um psiquismo próprio e pessoal. Seguindo esse raciocínio, veremos que as estruturas sociais devem ser erguidas, a princípio, sobre a base de significados que devem ser não apenas formulados, mas experimentados e vivenciados pelos indivíduos desta sociedade, para que assim possam se caracterizar como de fato imensamente significativos a esses indivíduos.
Ora, é mesmo o indivíduo a causa de toda a liquefação que se instala no meio social quando ele a torna viral, como também é ele o único remédio capaz de tratá-la quando temos, individualmente, os melhores atributos com potencialidade de operar – respectivamente – através da percepção, escolha e intervenção no meio, a partir do momento em que agimos radicalmente em favor do bem coletivo que, agora, é praticado não mais como mero dever altruísta ou como ato codependente de reconhecimento se não de medo em não fazê-lo, mas de conscientização de significados maiores que só podem ser trabalhados e conhecidos no interior do ser; o único lugar capaz de gerar significados e, uma vez discernido, operar; tanto quanto de torná-los insignificantes e, na escassez de percepção, aniquilá-los.
É no indivíduo que está este lugar denominado psique humana: inteligência abstrata dotada de consciência que, nesse caso, pode ser definida por três virtudes básicas, sendo elas a capacidade de perceber, sintetizar e responder à realidade que lhe abriga. Ao que diz respeito à consciência pessoal, essas virtudes em conjunto se apresentam como a cura para o próprio ambiente onde se situa como, ao mesmo tempo, também pode ser o gerador da enfermidade quando neste caso há a ausência do que se reconheça como consciência, onde se caracteriza uma clara e prejudicial indiferença, senão parcial, total do meio coletivo e assim, do bem coletivo. Em outros casos, ainda referente a ausência de consciência individual, ou moral, há uma deturpação de sentidos e até mesmo de preferências de valores que não podem ser resgatados por nenhuma lei instituída que age apenas como impedimento, mas nunca como conscientização formada pelo entendimento por já se saber autônoma, e portanto, responsável em si mesma e em desenvolvimento, na medida em que se reconhece formação, o que é bem diferente de se supor estar completa. É apenas enquanto se reconhece essa carência de formação que há a possibilidade humilde de buscar se formar, não por um movimento de ganância, mas por reconhecer em si a extrema necessidade. Dá-se então o ato de apreender (internalização de valores), provar e discernir significados.
Isto dito, é fundamental que dois significados sejam conhecidos por todo o indivíduo a formar uma sociedade. São estes significados a justiça e o bem coletivo que possibilitam a existência básica de qualquer forma social. Do contrário, não se pode ir adiante. Porém, uma vez que esses significados não são conhecidos, experimentados através da vivência prática de cada cidadão, e mais para além do seu papel social – ouso dizer – mas meramente como ser supostamente consciente; qualquer valor que lhe seja apresentado, válido ou não, será tomado como certo por mais deturpado e contraditório que seja tal valor, e este será assimilado e retido muito mais fácil do que um outro realmente verdadeiro, pois é tão deturpado quanto a percepção do seu receptor/assimilador. De modo tal que, se é o homem que cria, transmite e aprende valores válidos, é ele também que cria, transmite e aprende valores deturpados de acordo com a sua percepção e não há nada mais fácil de se reter que a deturpação: adulteração conveniente e barata gerada pela preguiça de sintetizar o que se vê ou, por já tanto deliberar, não perceber.
Desse modo, somos todos tanto capazes de propagar a enfermidade quanto carregamos a potencialidade de saná-la, senão por completo, numa proporção coletiva, ao menos na nossa transformação de valores que ocorre na realidade individual sem terceirizar o encargo de sua consciência almejando a corrupção palatável sobre o pretexto de que outros fazem do mesmo, pois deste modo, todo o trabalho se torna redundante – com a hipocrisia sendo feita em nome dela mesma, uma espécie de “direito a hipocrisia” – e em vão.
Uma sociedade corrupta elege princípios que correspondem ao caráter individual de cada pessoa, e esses princípios, por sua vez, erguerão a estrutura social que se mostrará igualmente corrompida e que só promoverá um ajuntamento social igual a própria estrutura que sobre ela está. Estrutura social injusta, promove indivíduos que constantemente naturalizam práticas de injustiça. Estrutura social egoísta, preocupados e interessados em temas apenas quando esses doem sua carne ou ferem o seu rendimento financeiro, dá a luz indivíduos cada vez mais deliberados e adaptados a realidade da corrupção, do materialismo, da indiferença e da desigualdade à medida em que se tornam coniventes e permissivos a ela em seu cotidiano.
Apresentada as justificativas citadas ao longo deste tópico, que se apresentam não como primícias isoladas mas como unidade argumentativa, a palestra segue a sua retórica explorando e estendendo os seus pontos chaves, voltando sempre a cobrança para o indivíduo que se evidencia permanentemente responsável por tudo que faz e pode fazer quando nele também habita o poder da percepção; sendo a medida que ele percebe a mesma medida que determinará o que sabe de si mesmo, e sendo assim, como age, como vive (concebe e discerne significados), ou falece (deturpa e dilui significados).
Conclui-se, dentre outras coisas a ainda serem expostas e trabalhadas durante explanação aqui proposta, que é impossível ter o mínimo de entendimento da realidade se não houver antes a atitude e a busca para se conhecer como ser, que em si se define como SER sendo a única entidade capaz de experimentar-se e conhecer-se enquanto o próprio e, assim e apenas assim, em natural decorrência disso possibilitando o conhecimento de toda a realidade a sua volta, como a realidade e o ser de outras pessoas e de significados para além das formulações universais.
Não se limitando a ser apenas uma abordagem meramente pedagógica, a proposta tem como base uma interpelação direta e prática com o público alvo a que se direciona, ao pretender abordar os objetos de estudo em sala de aula de forma acessível a todos os alunos, a medida em que expõe os temas de estudo em um nível mais familiar aos alunos mostrando assim serem estes temas muito mais pertinente a eles, abrangentemente, como pessoas, uma vez que vivem e constituem uma sociedade, do que imaginam ser, estritamente, como alunos - uma vez que a temática compete e é abordada no ambiente escolar.
METODOLOGIA
O sistema educacional brasileiro é regulamentado pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), instituída pela lei nº 9394, de 1996. É a partir delas que o governo mantém programas educacionais pensados a partir da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
A instituição escolar historicamente firmou-se como provedora de informação, mas mediante aos desafios impostos pelos tempos atuais, carece de mudanças para responder às demandas da sociedade pós-moderna. Tendo em vista que um modelo arquitetônico de 1785 pensado para prisões, panóptico, ainda se faz presente no contemporâneo. Este modelo projetaria celas circulares com uma torre de vigilância ao centro, com uma visão de um todo, com janelas em posicionamentos estratégicos para uma visão panorâmica de 360º, garantindo assim uma clara visualização de todas as celas a partir de um mesmo ponto de perspectiva. Todavia esse modelo acabou sendo instalado em outras instituições que visavam a disciplina e controle como as escolas, entre outros. Neste contexto se caracteriza como um sistema moderno de pensamentos, sendo a vigilância constante um aspecto central para o controle das massas. Um exemplo disso dentro da instituição de ensino são as distribuições de cadeiras, onde a frente se localiza a figura de autoridade, o professor, com uma visão geral da sala de aula, a padronização dos indivíduos por meio dos uniformes, retirando-lhes a individualidade.
Em 1975 Foucault disse, “quanto maior o número de informações em relação ao indivíduo, maior a possibilidade de controle de comportamento desses indivíduos”⁴. Esses mecanismos formariam o que Foucault chamou de tecnologia política, com poderes de manejar espaço, tempo e registro de informações (tendo como elemento unificador a hierarquia).
Esse sistema estrutural físico e educacional mais oprime e distância os alunos do que os aproximam da instituição ‑ a triste ideia de que “o que se aplica na escola não se aplica na vida, o que se aprende na vida não serve para interpretar na escola”.
A educação deve ser vista como um meio de transferir o conhecimento através das gerações. Mais do que garantir o desenvolvimento pessoal e profissional de cada indivíduo, influenciar a forma como a sociedade evolui coletivamente. E, conforme a sociedade muda, o processo educacional também exige mudanças.
Há estudos demasiadamente informativos sobre o funcionamento do cérebro em relação a captação de informações e armazenamento das mesmas. Durante o dia, se recebe muitas informações que a princípio se localizam na região do cérebro responsável pelas memórias a curto prazo, logo, em determinado momento todas as informações que não forem consideradas relevantes são descartadas. Após a devida filtragem de tais informações, todos os fatos que assumirem caráter de importância são armazenados na região do cérebro responsável pelas memórias permanentes, que influenciam nas tomadas de decisões ao longo da vida, visto que as memórias são fragmentos de impressões do ocorrido, sendo então armazenado permanentemente; não uma rotina de aprendizados puramente racional e sim emocional-racional. Dito isto, torna-se evidente que a maneira como a instituição se apresenta para o aluno o impacta em relação a como ele concebe aquele espaço institucional (como o entende, como se sente e como se relaciona com ele), influenciando também o seu desenvolvimento de ensino. Tendo em vista os estudos sobre absorção de informações através de estímulos emocionais, a aparência que a escola adota desde as suas estruturas até a decoração interna em seus corredores e sala de aula contribui para o modo como o aluno responde e aprende, podendo assim aproximá-lo ou distanciá-lo ainda mais nessa relação escola-indivíduo.
Considerando que a escola representa todo o processo educacional, causar a distância dos indivíduos de suas instalações é uma verdadeira derrota para a educação. As metodologias de interação evidentemente se tornam relevantes por intermédio da influência da absorção de informações. Logo as abordagens flexíveis que assumem certa emoção tendem a ter um maior impacto no processamento de aprendizados e, consequentemente, de certos valores a serem internalizados, gerando não apenas bons rendimentos de aprendizagem e promoção de valores (como de inclusão, respeito e diversidade de pessoas) mas também um desenvolvimento afetivo do aluno em relação à instituição a qual frequenta, e contribuindo, ainda, para a habilidade de relacionamento entre meio e indivíduo dos discentes para além do ambiente escolar.
Metodologias de linguagem simbólica e prática:
• Empatia e generosidade em idade pré-escolar — As crianças possuem uma capacidade de aprendizagem muito maior do que qualquer outra idade e também uma predisposição de ver o mundo de forma simbólica. É a idade perfeita para se trabalhar nelas, através dessa linguagem, valores morais que tomam forma como contos, mitos e fábulas, semeando nelas, desde o começo de sua formação, a ideia de que valores são a coisa mais importante do mundo.
Realização e conteúdo: A partir dos quatro anos de idade, pode-se introduzir a criança no mundo da filosofia de forma muito natural e simples de modo a preservar e mesmo instigar a sua habilidade simbólica para posteriormente, além da idade pré-escolar. Com um grupo de cinco crianças, dê a uma delas uma jarra de suco onde se encontra uma quantidade de suco suficiente para apenas quatro das crianças dividirem a jarra, inclusive àquela que a porta. Ela deve sentir que se tiver que faltar bebida para alguém, é uma honra que falte para ela, porque honra é mais gostoso do que suco.
• Aplicação de adesivos com temáticas inclusivas no espaço escolar — Voltada às escolas de ensino médio e fundamental, uma abordagem eficaz de promoção de valores é aquela que se integra junto ao meio espacial, se fazendo assim sempre presente e sempre comunicável para os frequentadores daquele espaço. A aplicação de adesivos estilizados sinalizando a pluralidade entre os indivíduos no ambiente tornaria a instituição mais acolhedora, aproximando os indivíduo das instituições escolares na medida em que demonstra reconhecer e acolher características das diferentes identidades que constituem a escola, paralelamente também, promovendo o valor do respeito à diversidade alheia.
Localização, dimensão e características: Nesta categoria, os adesivos possuem dimensões físicas respectivas aos locais em que serão aplicados, visando sempre a melhor visualização por parte dos alunos juntamente com a conveniência visual e estética do espaço. Sinalizações verticais, neste caso, contribuem para uma melhor visualização, logo adesivos em dimensões retangulares postos na horizontal possuem maior conveniência estética-espacial quando aplicadas nos espelhos de escadarias (a parte vertical do degrau que leva ao próximo piso). Outra alternativa é a incrementação de adesivos da mesma temática nas quinas dos espelhos dos banheiros, onde de certo a visualização é sempre garantida. Evidente que ao falarmos de inclusão não estaríamos fazendo jus a proposta se não incluirmos também nela aqueles com deficiência visual; especialmente para estes casos, faz-se a aplicação desses adesivos já mencionados com parte de sua superfície em relevo em braille, localizando-os ao lado de maçanetas e na lateral das mesas presentes em salas de aula e refeitórios.
Conteúdo: Com mensagens de cunho inclusivo que representassem a diversidade, desde orientação sexual, etnia e de religião, os adesivos trariam símbolos próprios de cada comunidade representada, tal como pequenos aforismos que pertencem ou represente-nas e vão de encontro com os princípios morais de respeito, tolerância, pluralidade e valorização da individualidade.
• Oficinas recreativas — Um programa de oficinas recreativas em funcionamento durante os finais de semana voltado para a comunidade, retornando os portões da escola para aqueles os quais ela possui eterno compromisso. Não se limitando à promoção de cursos, dentro dos seus recursos estruturais e humanos, uma oficina onde se ofereça programas de entretenimento para pessoas e famílias da comunidade, transmitindo valores como o de cidadania, cooperação, autonomia e incentivo a produtividade recreativa, além da promoção convencional de conhecimentos diversos dos campos de estudo.
Realização: As oficinas podem ser mantidas por financiamentos particulares, mas não necessariamente desses dependentes. Os realizadores podem ser tanto alunos, familiares e pessoas da própria comunidade enquanto voluntárias, como também professores, artistas independentes e demais profissionais ou entidades que se associem ao programa. O importante é demonstrar, para além dos conteúdos realizados dentro das oficinas, que com a coletividade e cooperação mútua somos capazes de realizar praticamente qualquer coisa que tem origem em alguns para o benefício em comum de muitos.
Conteúdo: Dentro das oficinas poderá ser desenvolvido desde projetos de produção material e artesanal, jogos educativos, contos e teatro de fantoches para idade pré-escolar (aliás feitos com o material da produção artesanal), oficinas artísticas de pintura, música e literatura, dentre outras atividades com o intuito de trazer a comunidade para dentro da escola e educar. Essa prática possui muitos níveis de educação que vão desde a sua idealização, articulação da comunidade, realização e manutenção do mesmo; resgata e desperta o senso de pertencimento dos envolvidos àquela instituição, e ensina responsabilidade com o ambiente através da manutenção do espaço escolar por parte dos seus visitantes, além de oferecer uma atividade a grande parte da população que se encontra em estado de ócio e sem renda.
OBJETIVOS
– Conscientizar os alunos de suas ações, tanto dentro quanto fora da escola, instigando a virtude do caráter.
– Uma análise de contexto sociopsicológico para entendermos melhor a dinâmica entre o indivíduo e o meio que temos hoje.
– Enfatizar que a atitude individual é essencial para a tomada de consciência e, consequentemente, a viabilidade de uma sociedade saudável.
– Analisar a dinâmica da retroalimentação de pretextos deturpados e o fim dos mesmos que se apresenta como solução prática para o indivíduo.
– Acima de tudo, um convite ao autoconhecimento; a viagem para dentro de si.
ANEXOS E REFERÊNCIAS
1 - Macedo, L. S. R., & Silveira, A. C. (2012). Self: Um conceito em desenvolvimento. Paidéia (Ribeirão Preto), 22(52), 281-289.
Recebido: 17/05/2010 - 1ª revisão: 21/11/2010 - Aceite final: 15/02/2011
http://www.scielo.br/pdf/paideia/v22n52/14.pdf.
2 - Self (psicologia) in Artigos de apoio Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2018. [consult. 2018-07-15 02:08:23]. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$self-(psicologia).
3 - Freud, S. (1908). “Escritores criativos e devaneio”. In S. Freud, Edição standard das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 16). Rio de Janeiro: Imago, 1976.
4 - Foucault, M. (1975). “Vigiar e Punir”. 5a ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2014.
5 - Jung G. (1910). “Individuação & Coletividade”. Rio de Janeiro: Moderna, 1999.
6 - Kant, I. (1783). "Aufklärung".
https://novaescola.org.br/conteudo/1522/michel-foucault-um-critico-da-instituicao-escolar
https://www.politize.com.br/sistema-educacional-brasileiro-divisao/
https://super.abril.com.br/mundo-estranho/quanta-informacao-o-cerebro-pode-armazenar/
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS E LETRAS
Docente: Mayara Gama de Lima
Disciplina: Psicologia da Educação e Desenvolvimento
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